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O Mínimo para viver

 Pra falar sobre este filme, vamos começar a pensar um pouco sobre a anorexia. 
 Anorexia é um transtorno alimentar, que se dá principalmente em mulheres, o indivíduo tem uma visão distorcida do seu corpo, acaba ficando com uma obsessão por perder peso, se privando de comer por medo de engordar e realizando muitos exercícios. 
 Por outro lado está vinculado também à problemáticas familiares, principalmente na relação mãe-filha, pois por se tratar de um transtorno alimentar possui ligação com a fase oral (primeira fase listada por Freud do desenvolvimento psicossocial), essa fase é fundamentada principalmente pela alimentação do bebê por sua mãe (amamentação). Ressaltando que a mãe tem papel de alimentar o bebê, fazendo o reconhecer a fome, se isso  for insuficiente, poderá refletir em outras fases da vida.Também podemos pensar na dificuldade de aceitação da feminilidade que é construída junto com a mãe. Dependendo de como é constituída essa relação mãe e filha, a anorexia pode ser uma possível tentativa de separação desta figura materna.
 A relação mãe e filha se dá desde a entrada até a saída do
Complexo de Édipo*. Pois há a separação da mãe e criança, e a entrada do pai, como um terceiro nesta relação, sendo de suma importância a participação deste. Um fator importante para pensarmos é a recusa por um corpo adulto, pois um dos sintomas biológicos da anorexia é a interrupção da menstruação, alguns  autores acreditam que isso é uma recusa da maturidade sexual e da feminilidade (tornar-se mulher como a mãe). Existe também a recusa da transição para a vida adulta, conservando um corpo infantil.
 Algumas considerações de Dolto (1984)  é que  "se a mãe é sentida como desvitalizante, então sua presença provoca no bebê comportamentos e reações peristálticas invertidas ou perturbadas: a anorexia"
 Agora que pensamos um pouco sobre este transtorno alimentar, vamos falar do filme em si. 
Ellen é uma jovem de 20 anos que sofre de anorexia. Logo no inicio do filme é nítida a problemática familiar. 
 Reside com o pai, madrasta e irmã. O pai sempre ausente, na verdade não aparece em nenhuma cena do filme, já conseguimos então visualizar um dos problemas, pois a madrasta acaba assumindo papel de intermediária dessa relação, dizendo para Ellen coisas que o pai deveria dizer, em uma das cenas a mesma questiona o motivo pelo qual o pai não disse diretamente para ela o que queria. A ausência do pai sempre é justificada por conta do trabalho.  
 A mãe de Ellen mora em outra cidade com a esposa, parece se ausentar também da vida da filha, e isto traz angústia. Em seu quarto enquanto fazia abdominais nota-se a presença de alguns desenhos feitos por ela na parede. Os desenhos ao meu ver denotam a preocupação corporal, angústia e solidão, uma maneira que ela encontrou para talvez se expressar e exteriorizar o que sentia.

 

 

 

 

 

 

 

 


 Susan (madrasta) a leva para uma avaliação médica. Ela é atendida por Dr. William. Suas costas estavas desgastadas e machucadas devido a quantidade de abdominais que fazia, não sabia quando foi sua última menstruação e tinha mais pêlos que o normal devido a perda de peso e para manter seu corpo aquecido. 
 “Não posso te ajudar, se não quiser viver”, Dr William disse para ela, logo após ter avaliado e observado que se encontrava em um estado crítico. A mesma se mostra reticente a realizar o tratamento, porém vai para a “clínica”, onde encontram-se alguns jovens também com transtornos alimentares.
 Nas terapias em grupo os jovens falam á respeito de suas lutas e vitórias, todos compartilham frustrações e ganhos, quando chega a vez de Ellen, junto com a terapeuta constrói de que sua luta talvez tenha sido ir até a clínica e sua vitória provavelmente era estar ali. 
 Uma das personagens começa a usar sonda, e Ellen por ser obcecada com a quantidade de calorias, menciona que se alimentar por sonda era calórico. Logo em seguida na hora do almoço a menina começa a chorar e Ellen fica se sentindo culpada, sentimento este  que a acompanha em várias situações. 
 Existe um momento nesta clínica em que é realizada terapia familiar. Vieram para a terapia: Susan (madrasta), Kelly (irmã), Judy (mãe) e a mulher de sua mãe. Dr William menciona que haviam muitas mães naquele ambiente e novamente a ausência do pai é notada, não possuía intervenção paterna naquela problemática familiar. Durante a terapia, é nítida a confusão, apenas a irmã demonstrava compreensão e acolhimento.  As suas "mães" apenas discutiram diversos assuntos á respeito do motivo pelo qual ela se encontrava na atual situação, jogando a culpa em terceiros. Em um determinado momento falam sobre os desenhos expressivos que Ellen fazia e postava no tumblr, e uma  jovem que viu seus desenhos, comete suicídio mandando uma carta para ela, isto gerou polêmica e novamente assumiu a culpa por essa morte. 
 Dr William suspende a terapia familiar, por perceber que não estava ajudando, parecia mais um "show" do que uma terapia de fato e reconhece que Kelly foi a única que disse algo que não parecia egoísta.
 Depois em conversa com Dr. William, ela demonstra não gostar de seu nome, o mesmo sugere que então mude de nome, muda para "Ellai" (não sei se se escreve assim gente), essa sugestão foi importante e simbólica, porque parecia que ela precisava descolar do que já estava pré estabelecido, principalmente do nome que geralmente é uma escolha feita pelos pais. Precisava então se responsabilizar por suas ações e tirar o fardo da culpa de suas costas. 
 Outro ponto que observei foi o relacionamento de Ellen com Luke (jovem que também participava do grupo da clínica e possuía transtorno alimentar), parece que o olhar do outro, principalmente do sexo oposto, era importante para ela, e alguns apontamentos que Luke fez sobre parar de se culpar e culpar os outros por seus problemas, assim como só olhar para o próprio umbigo e ficar agressiva o tempo todo, fizeram ela refletir e começar a se abrir um pouco mais para as interações, tanto com ele quanto com o grupo. 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 Uma das integrantes do grupo engravida, o bebê era do sexo feminino e comenta que talvez a possibilidade de ser mãe e se importar com outra pessoa era uma boa ideia, Ellen responde positivamente ao comentário da colega de grupo, dizendo que gostou do que ela disse. Aqui aparece a questão da relação mãe e filha, e o quanto isso  parecia ser uma questão que ela precisava trabalhar.  Quando foram em um passeio surpresa, o grupo se deparou com um cenário onde chovia, e o Dr. questionou se alguém sabia porque estavam ali, Luke respondeu: " Porque estamos vivos!", e começa a dançar na chuva, todos de alguma forma começaram a interagir com aquele cenário, como se estivessem celebrando a vida. Depois do passeio todos pareciam bem, mas Ellen saiu correndo e foi fumar (algo que fazia em algumas situações que aconteceram no decorrer do filme como uma fuga). Dr William foi conversar com ela,  e o que a estava incomodando era o fato de que a vida poderia ser realmente bela. 
 Começa a se sentir valorizada e acolhida pelo grupo. Porém algumas situações a fizeram regredir. Uma delas foi o fato da jovem que estava grávida, perder o bebê e a outra foi relacionada ao seu relacionamento com Luke, pois em um determinado momento se sentiu rejeitada. Dr William também a faz refletir sobre esses fatos, e sobre estar sempre em busca de segurança, o que nem sempre iria obter. Parece que isto mobilizou questões referentes ao  desamparo, e ela vai embora da clínica para casa de sua mãe, Judy. Este momento do filme é bastante simbólico e importante, pois neste reencontro com a mãe foram esclarecidas muitas coisas. A mãe relata que teve depressão pós parto, e não conseguia nem olhar para Ellen, fala a respeito de se sentir culpada por isto, por não poder dispensar do amor quando a filha precisava dela ainda bebê. Faz então uma mamadeira com leite de arroz e pede para dar isto á filha, como se quisesse resgatar a relação mãe-bebê, que parece não ter sido bem constituída. Por fim diz pra a filha que o que ela escolhesse, iria aceitar e entender. Como se permitisse que Ellen fizesse uma escolha entre viver e morrer. 
 O final é bastante interessante e não vou dizer aqui, porque sei que têm pessoas que ainda não assistiram o filme. 

* Complexo de Édipo: A criança cresce assim numa relação triangular (filho, pai e mãe), crescendo com a ideia que os pais, fazem parte de si (devido a extrema dependência). O Complexo de Édipo vem então, marcar a separação entre ela e os pais (acontecendo por volta dos 3 até aos 6 anos de idade), neste momento a criança começa a perceber que não é o centro do mundo, que o amor não é unicamente para si e que os pais não a podem proteger completamente do mundo. - Achei essa definição mais fácil para entendimento deste conceito em um primeiro momento e encontra-se no site: http://www.psicologiafree.com/areas-da-psicologia/psicologia_clinica/afinal-o-que-e-o-complexo-de-edipo/

 Sabe aquele poema lindo que é abordado no filme?
 Se chama coragem, e tem tudo a ver com anorexia e qualquer transtorno alimentar, pois o indivíduo precisa de muita coragem para enfrentar essa questão. 


Coragem

É nas pequenas coisas que a vemos.
O primeiro passo da criança,
tão incrível como um terremoto.
A primeira vez que você andou de bicicleta,
correndo pela calçada.
A primeira surra, quando seu coração
saiu sozinho em viagem.
Quando o chamaram de chorão
ou pobre ou gordo ou maluco,
e fizeram de você um estranho,
você tomou o veneno deles e 
o escondeu .

Depois,
se você enfrentou a morte das balas e bombas,
você não usou um estandarte.
Você usou um chapéu para
cobrir seu coração.
Você não afagou sua fraqueza
embora ela estivesse ali.
Sua coragem era um carvão
que você continuou engolindo.


Anne Sexton

Trailer do filme: https://www.youtube.com/watch?v=aXS2taIXXQA

 

Referências :

Dolto F. Sexualidade Feminina.São Paulo. Martins Fontes. 1984 

Souza LV, Santos MA. A família e os transtornos alimentares. Medicina; Ribeirão Preto, 2006; 39(3):403-9.

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